Defesa da Vida ou da Morte?
Meus caros amigos, as ilusões da vida que iremos nos concentrar são bem menos aparentes do que possamos imaginar. Parece-me curioso os fatos que tenho acompanhado recentemente na mídia nacional sobre o caso de uma criança recentemente submetida a um aborto, bem como, as declarações da famosa “Igreja Católica Apostólica Romana”, na qual, têm-se de um lado uma Igreja rica e poderosa e de outro, uma criança de nove anos, estuprada desde os 6 pelo padrasto de 23 anos, residindo com a mãe num bairro de classe baixa em Pernambuco. Portanto, a primeira ilusão que se pode refletir no dias atuais com grandes influências na vida diária, é a religiosa.
Minha preocupação centra-se no direito das pessoas de exercerem suas escolhas, mesmo que estas do ponto de vista existencial dependam de tantos fatores, que nem sei se é adequado denominá-las de escolhas. Ora, eu me pergunto, qual é o maior ato de violência, o estupro da menina ou a excomunhão da Igreja em nome de Deus?
Caros amigos, antes de nos atermos a esta pergunta, é preciso que compreendamos algumas questões históricas e sociais, e neste exato momento, os crentes na Igreja que me perdoem, mais para mim, a Igreja se igualou com o padrasto da menina, do ponto de vista da violência, a qual, desumaniza o ser e o coisifica. Assim, conforme, as Comunidades Eclesiais de Base da Itália, novamente a Igreja se mostra atrasada e muito distante da realidade humana (1). Aliás, sua proximidade é com uma realidade tão utópica e arcaica que só encontra sentindo maior nos seus textos Doutrinários.
A Igreja parece desconhecer os próprios ideais que o seu Cristo defendia, ou seja, enquanto seu Cristo acolhia, perdoava e amava, ela excomunga (isto, é, exclui), condena e julga, e ainda por cima se intitula cristã. Logo, me parece a mesma ocupar um lugar um tanto desprezível e preocupante. Portanto, passível das mesmas críticas que o próprio Jesus fazia ao Judaísmo, do qual, descende o Catolicismo. Outrora, não podemos esquecer que tal postura é adquirida por meio da Lei Magma da Igreja, o Código de Direito Canônico, que estabelece o seguinte Canôn: “Quem provoca aborto, seguindo-se o efeito, incorre em excomunhão latae sententiae” (Can. 1398). Como se coubesse a Igreja ocupar um lugar inerente a sua própria Divindade, fazendo-nos, incorrer a seguinte dúvida: Afinal, quem é o Deus Católico? Iahweh ou a Igreja Católica?
Coerente, ao Código de Direito Canônico encontra-se o Catecismo da Igreja mencionando o aborto como verdadeiro crime e/ou delito contra a concepção da vida, como se a Igreja tivesse noção do inicio da vida e pudesse universalizar a cultura dos povos; posições das quais nem a medicina, nem a antropologia ousaram racionalmente. Ademais, para encerrar-se o show de incoerência teórica e prática pronunciamos o Compêndio da Doutrina Social da Igreja que ao se referir sobre o aborto reconhece a liberdade religiosa da pessoa e pressupõe a não coação das mesmas a agir contra sua consciência. Destarte, se observarmos bem trata-se de um verdadeiro disparate numa Igreja que coage as pessoas por meio de punições, como excomunhão.
Aliás, há muito tempo, a Igreja se declara como a voz de Deus no mundo, se intitulando como a única Igreja verdadeiramente criada por Jesus Cristo. Conquanto, qualquer livrinho de questionamento aos protestantes encontra-se esta falácia divulgada no primeiro capítulo. Eu mesmo cansei de escutar tais afirmações desconexas com a verdadeira realidade. Ninguém diz por exemplo que a Igreja Católica, oficialmente do modo que a conhecemos, foi criada pelo próprio Imperador Constantino, possivelmente para ampliar seu controle político e social sob o Império Romano. Aliás, para isso ele fez várias sugestões aos Bispos do Primeiro Concílio de Nicéia, as quais, foram muito bem aceitas, dentre elas a divisão de Deus em três pessoas (a famosa Santíssima Trindade), influenciando também sobre a decisão pela deidade de Jesus Cristo.
Não obstante, é curioso que a Igreja sempre arranje um jeitinho de comprovar na Bíblia suas exímias explicações. Especialmente esta sobre sua criação que conforme os Bispos de Nicéia, encontra-se ressoada nas afirmações de Jesus quando diz a Pedro: “Tu és Pedro, e sobre esta pedra edificarei a minha Igreja, e as portas do Inferno nunca prevalecerão contra ela” (Mt, 16, 18). Ademais, parece-me muito mais correto a interpretação teológica de que Jesus afirma da Igreja se referindo aos seres humanos como templo da morada de Deus e não de uma Igreja Hierarquizada e Burocrática, derivada de antigas doutrinas judaicas, egípcias, babilônicas etc.
Assim, a Igreja que deveria cumprir um papel, segundo ela mesma afirma, de reunir as pessoas em volta do amor de Deus, faz justamente o contrário, gerando ódio e violência entre as pessoas. Infelizmente, não é de agora que isso tem acontecido, desde os tempos da “Santa Inquisição”, que de santa não teve nada, a Igreja vêm descumprindo seu papel no mundo, matando pessoas inocentes em nome de preconceitos (muitas mulheres foram assassinadas pela Igreja sobre o pretexto de feitiçaria ou bruxaria quando na verdade eram curandeiras e/ou benzedeiras) e enganando as pessoas (vendas de indulgências).
Portanto, descrito o cenário histórico e social, podemos nos deter à pergunta primordial. Entendo, que a menina e sua irmã de 14 anos tenham sofrido por três anos violências em seu corpo, das quais, jamais poderão ser esquecidas, nem por elas, nem pelas pessoas que se importam. O fato é que a excomunhão pronunciada pela Igreja aos médicos e a mãe das crianças encontra sentindo na excreção pública, e portanto, as conseqüências psicológicas para estas pessoas, serão bem maiores. Elas terão que lidar com o preconceito e exclusão onerado pela própria Igreja de “amor”. Logo, estas pessoas sofrerão bem mais e por um tempo que não se pode determinar. É por isso, que conforme o Promotor Roberto Tardelli, a justiça poderá ser acionada para este caso e intervir nas decisões do Arcebispo de Olinda e Recife, dom José Cardoso Sobrinho, a despeito da excomunhão (2).
Outro fato, a ser analisado e que corrobora tal visão, centra-se nas declarações, do cardeal baiano, ao afirmar que os gêmeos que a menina gerava não tinham culpa. Sobre isso, poderia se perguntar: E a menina tem culpa de ter sido estuprada? Afinal, o fato de sua vida correr risco não importa a Igreja? Quem é que Deus queria salvar na visão da Igreja, a menina ou os gêmeos?
Portanto, meus caros, vejam o tamanho da incoerência declarada. Imaginem uma criança morrer antes do quinto mês de gestação (conforme avaliação de mais de um médico), porque a Igreja considera pecado interromper uma gravidez forçada pela violência. Ou seja, é duas violências ou mais sendo executadas ao mesmo tempo. Assim, não se passa de uma ilusão a tal defesa da vida, alegada pela Igreja, na verdade o que se defende é a morte, e o pior, ao certo, seria dos gêmeos e da menina também.
Em suma, vejo a mesma Igreja que matou tantas pessoas em nome do seu preconceito, agora tentando deturbar a laicidade do Estado; logo exercendo influência sobre a noção de justiça de todos. Tal postura deve ser eximiamente refreada pelo poder judiciário de qualquer país, já que “Órgãos Sociais” quaisquer não devem desempenhar poder coercitivo sobre as pessoas. Ademais, onerando-as de atos de violência tão corruptíveis como as tais excomunhões.
Obs.: (1) Leia a reportagem da Folha de São Paulo, a respeito das declarações das Comunidades Eclesiais de Base da Itália. Acesse através deste link: http://noticias.uol.com.br/ultnot/ansa/2009/03/07/ult6817u1905.jhtm
(2) Veja a Video-Reportagem no UOL Mídia, com as declarações do Promotor Roberto Tardelli. Acesse através deste Link: http://noticias.uol.com.br/ultnot/multi/assistir.jhtm?media=promotor-excomunhao-pode-ser-contestada-na-justica-04023164E0C97326